sábado, 26 de novembro de 2005

A Cisma do Vaticano

Já não há nada que surpreenda neste andar de passo em frente e dois atrás que a Igreja Católica insiste em manter. Aquando da morte de João Paulo II os católicos progressistas chegavam aos montes à praça de S. Pedro esperançosos na aclamação de um Papa novo e sobretudo isso... novo. Novo de ideias e verdadeiramente vocacionado para aquilo que a Igreja deve ter como alvo: as comunidades; e sobretudo, ser um centro integrador das diferenças e dos problemas das pessoas, pragmático e ajustado às demandas do presente e das modernidades, conciliando tradição e os protocolos do costume.

Na confusão do fumo branco ou preto, saiu novamente a indefinição do cinzento no conservadorismo de um novo Sumo Pontífice que ninguém e toda a gente esperava: Bento XVI trouxe sobretudo uma brisa do mesmo mas com algum frio. Aquele olhar gelado que incomoda, ajustado de um sorriso incompleto tornam-no naquilo que os progressistas não queriam, um rosto tão enigmático e perturbador, quanto "angélico"(?), como dizia Fidel Castro na sua recente visita a Roma.

No entanto, o que vejo é uma igreja órfã de um Papa Polaco que apesar de conservador e anti-anti-contraceptivo (como se o preservativo fosse só isso...) deu alguma cor à Igreja acrescentando e aproximando a juventude de um espaço de envelhecidos. No entanto a juventude aproxima-se mas leigamente. A utopia da vocação é paranóia de uma minoria. Os seminaristas são-no alguns (se bem intencionados, claro) pelo serviço, os outros pelo estatuto e pela influência, pelo dinheiro outros tantos e uma grande parte deles porque fogem do dedo inquisidor da mesma instituição onde se refugiam… Confuso? Não me parece, se bem que a hierarquia da igreja é quase toda ela e em cada membro o exemplo da má gestão da condição humana.

A recente interdição do sacerdócio a homossexuais é mais um exemplo do desfasamento da igreja em relação à nova sociedade ocidental e, em certa medida, em relação a si própria, Alguns dos sacerdotes são filhos de pais castradores que pensam no seminário como um expurgatório de um “pecado” que poderá passar e que lhes lave a mãos de qualquer erro na educação, quando o erro é sobretudo a ignorância deles próprios. Da mesma maneira, querendo prevenir novos escândalos de pedofilia, a Hierarquia do Vaticano remedeia pela ingenuidade, confundindo tendências sexuais com parafilias e disfunções psicológicas.

A pedofilia é um problema sui generis, de todas as tendências, não sendo em si, o comportamento normal de nenhuma. Infelizmente, parece que ser um pedófilo à escala heterossexual aligeira a pena, Abusar sexualmente de uma criança quer do sexo feminino quer do masculino, é igualmente repugnante e que deve ser punido e repudiado com a mesmo sentimento. Com isto, na realidade, a Igreja só resolve metade do problema, porque os restantes pedófilos escondem-se por entre os auto-proclamados heterossexuais que se juntam ao aparelho religioso.

O Vaticano tem desiludido a cada mostra de abertura ao realismo e à diversidade das culturas, as mesmas que têm os seus pormenores e comportamentos mais ou menos estandardizados, intragáveis ou não, mas que são de cada um que as vive, desde que não seja prejudicial ao ser humano em si. E mais uma vez, Roma compromete ao rejeitar nos seminários, quem defenda ou respeite a chamada cultura Gay ou LGBT. Não que as tenha de defender, mas tem de aceitar uma Parada como aceita a Tourada ou mesmo a própria cerimónia do Funeral de João Paulo II, com todo aquele exibicionismo rico de uma Igreja que deveria ser dos pobres, e da exposição mediatizada do cadáver embalsamado do Papa.

No fim de tudo, tanto eu como outros, educados no catolicismo, mais ou menos crentes, dia sim, dia não, fomos embora ou apagamos o televisor. Apesar de tudo a Igreja e as religiões são mais humanas que divinas, nos males e nas boas coisas, inerentes aos homens e mulheres que as constituem e no dia-a-dia só mais um (grande) pormenor…

1 comentário:

Pedro Morgado disse...

Artigo fantástico, escrito de uma forma excelente! Continua...