quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

O Lugar da Vaia

O meu incómodo pelas vaias em cerimónias de Estado tem uma razão de contexto. Não creio que a celebrações com Figuras de Estado sejam lugares para vaias a um político, ou políticos, em particular ou às suas políticas, metidos que estão ali na formalidade simbólica do cargo. Entendo-o aí como uma vaia ao Regime em si. Mas se calhar é o que as pessoas querem, mas ainda não se aperceberam disso. Diga-se a título de exemplo: Ceausescu caiu depois de numa cerimónia de Estado do seu próprio regime. Ele era o regime. Os romenos assobiaram Ceausescu numa cerimónia de Estado e assobiaram o Regime. O comunismo caiu na Roménia. Mudou-se, a Roménia é agora um Estado democrático e um país integrado na U.E..

A contestação ao Governo, entendo-a aquando da vaia à inauguração de medidas, obras, promessas ou despromessas eleitorais. Compreendo-as na greve, nos assobios ao encerramento de urgências, nas berradelas à reestruturação dos serviços públicos,nas vigílias pela Educação, pelo que os políticos eleitos fazem em desacordo com o que prometeram, por pura birra, por puro engano , por pura falta de informação. Não tenho de concordar com a legitimidade dos protestos, eu protestaria por muitos outros motivos e com grande parte do espectro dos partidos. Mas há sempre uma democrática e legítima, como mais saudável opção: votar noutros partidos, entrar num e mudá-lo por dentro, tentar lobbilizar por movimentos cívicos. Ou então, se o mal é sistémico, fazer cair esta República e esta democracia. Plantar outra que recomece, que nasça direito e não entorte.

Mas não. Por cá vai-se assobiando, a torto e a direito, em todas as circunstâncias: em casa, no café, a tomar banho, na ceia de Natal, no emprego, tanto que se pensa que a determinada altura até nos tornamos neuróticos. Nesse o momento assobio e a vaia perdem significado. Como a história do pastor e do lobo que não havia. Expia-se a energia toda, arrepende-se no exagero e no fim até se vota neles de novo, por pena às vezes, ou porque a mão até treme naltura de marcar cruz noutro.

Fica outro meu exemplo não gosto muito da bandeira portuguesa, nas cores e na confusão dos símbolos, acho-a parola, mas é a bandeira nacional, respeito-a e gosto dela como se fosse uma mãe feia, canto-lhe o hino quando é preciso. [Mas com calma, longe estou da mocidade portuguesa, por mim, antes ia, o Hino à Alegria]

E aqui fica resumida a minha opinião: a vaia tem o seu lugar legítimo e apropriado. Não se contesta a tacanhice da Igreja assobiando durante uma Eucaristia, é aliás contraproducente a não ser que se a queira mandar toda a estrutura abaixo ou quando assim for, mudar-lhe os paradigmas de funcionamento. Ora, em cerimónias de Estado, onde o primeiro-ministro é figura tão simbólica quanto a bandeira, naquela mariquice protocolar, o assobio é aí ao Regime e como funciona. E portanto lugar de descontentamento adequado e privilegiado para pedir mudança, mas num todo. Era o que queriam os supostos manifestantes em Braga, era o que queria o Pedro Morgado?

2 comentários:

josé manuel faria disse...

Se as cerimónias protocolares são meras mariquices, não se entende o tão politicamente correcto do combate ao assobio por parte do Vitor.

Vítor Pimenta disse...

Caro JMFaria. Não leve a mariquice numa tentativa minha de despeito. Vejo igual ridículo nas paradas militares e naquelas onomatopeias largadas pelos de maior patente. E não vou para lá assobiar e vaiar os soldados...