terça-feira, 26 de agosto de 2008

Crónica de uma Região que está com'há-de ir: por água abaixo


Há cerca de 20 anos atrás, por iniciativa do Estado, a Linha do Tâmega entrava num processo de morte. O serviço piorava e desleixava-se a manutenção abrindo alas ao descontentamento das populações servidas pelo comboio. Os autarcas de então negoceiam com o Poder Central contrapartidas ao mais que certo encerramento da Ferrovia, desde Amarante a Arco de Baúlhe. Mas o que acabavam de acordar era a morte da Região de Basto com esse nome.

O que o Estado lhes oferecia em troca era uma Via Rápida. Arco de Baúlhe, estação terminal, elevava-se no ano seguinte a Vila, como compensação. A via do Tâmega enquadrava-se muito bem no novo paradigma dos transportes em Portugal: a rodovia. No entanto, ficava-se o asfalto por Celorico de Basto, sensivelmente a meio do percurso desactivado da linha do Tâmega e as restantes populações de Celorico, Mondim de Basto e Cabeceiras de Basto, esquecidas e irremediavelmente desconectadas umas das outras.

Desde então, com sucessivas eleições autárquicas acentuam as rupturas. Os concelhos, de cores partidárias diferentes, mas com visões semelhantes optam por olhar em direcções distintas. De costas voltadas, na Região de Basto, Celorico de Basto está agora mais próximo de Amarante que de Cabeceiras de Basto e esta mais próxima de Fafe. Só assim se percebe que com a conclusão da Auto-Estrada A7, se acentue o afastamento dentro de uma Região. E pudera: a A7, com o seu Nó de Basto, limita-se a servir cabeceirenses e pouco mais. É mais um Nó de Baixo Barroso.

Lentamente a Região de Basto deixa de existir na prática – e se calhar nunca existiu. Na embrulhada burocrática das NUTS, na propaganda, no caciquismo, as pessoas vão, pouco a pouco, abstendo-se de comentar, de perguntar sequer. Os cidadãos são afastados da discussão política e do debate dos projectos importantes para a Região.

Corremos o risco, actualmente, de perder o Vale do Tâmega como o conhecemos, na sua beleza, na sua riqueza paisagística e cultural para 4 barragens monstruosas que afogarão irremediavelmente as margens da nossa memória. Tragicamente, até as fronteiras internas da Região de Basto, as que separam Mondim e Ribeira de Pena, em Trás-os-Montes, de Cabeceiras e Celorico, no Minho, vão acentuar-se com a água. Vai ficar um enorme lago pelo meio. E estranhamente não há assembleia municipal nem deputado que se digne a discutir, em sede ou com as populações, tamanha enormidade, tamanha prepotência de Estado e corporações, tamanho insulto à democracia.

5 comentários:

Carlos Leite disse...

a região de basto como regiao unica está condenada ao fracasso, pela forma como funciona politicamente, é um processo no meio do poder autarquico que ainda nao no deu pessoas suficientemente visionarias para perceber todas as vantagens emanentes de um a forte promoçao e trabalho em traçar objectivos conjuntos.era bom que deixassemos de ser os coitadinhos de uma e outra região para passarmos a ser motores ativos da nossa.
aqui no post de uma forma muito sintetica vais pondo de forma clara o dedo nas feridas que ainda medram, embora no caso das barragens nao esteja completamente de acordo, pois acho que podemos tirar um muito bom partido delas, haja inteligencia, imaginaçao,porque a questao dos grandes lagos se estes forem de aguas limpas nao me parece que seja tao alarmante,parecendo-me mais dificil de conciliar as eventuais oscilaçoes do nivel das albufeiras, porque se estas forem mantidas num nivel constante, podem ser olhado como grandes lagos artificiais, á imagem do alqueva, alster(hamburgo) etc...
o aguas hotel de mondim apareceu ali á espera disso, fizeram um estudo do nivel da albufeira,e fixaram o hotel num ponto crcial para tirar a maior vantagem do lago, e por acaso conseguiram fixar a futura marina ás suas portas( mas isso ja foram outros quinhentos).
força Vitor continua, a ver se de uma vez por todas se começam estrategias para converter a eventual desgraça num grande proveito.
Abraço

Mac Adame disse...

O que é que as assembleias municipais vão discutir? Não estão os municípios minados por subalternos dos que minam todo o país a partir de Lisboa? Enquanto os municípios não forem geridos por cidadãos independentes, livres de interesses partidários, vai sempre ser assim ou pior ainda.

Anónimo disse...

Por onde anda a Dra. Isabel Coutinho?

Vítor Pimenta disse...

A preocupação da "inexistência da Região de Basto" é premente, e como vês, também tu a partilhas. A questão, Miguel, neste caso, não está nas possíveis vantagens para a hotelaria e para o novo-riquismo das motas-de-água (desculpa-me a linguagem meia ressabiada) mas na prepotência com que se planeiam estas coisas sem consultar as populações, sem pesar os contras (no meu entender bem mais) que os prós. Ninguém me tira a ideia da catástrofe que é transformar um rio que sempre se correu em harmonia com a região, basta ver as belas cidades ribeirinhas (como Amarante e Chaves), num colosso de águas profundas. É medonho.

Caro MacAdame: não posso estar mais de acordo contigo, porque raras são as excepções a levantar-se contra esta atitude anti-democrática. Mas o povo leva com eles e vota neles em seguida.

Sousa Pereira: Isabel Coutinho está de férias, provavelmente. Para além de ser Agosto, o Parlamento está em obras.

Dario Silva disse...

Subscrevo a visão e análise de Vitor Pimenta.
E eu iria um pouco mais longe - mas sou suspeito - quem perde(u) o comboio* deixa de existir, desaparece.
Provavelmente as Terras de Basto começam a sua deriva quando deixaram o comboio partir** à aventura. Foi cada um p'ra seu lado e nunca mais ninguém os viu... tenho para mim.
Mas eu sou suspeito.

* metaforica e literalmente.
** mas não sei ainda se o comboio simplesmente partiu, se foi mandado embora ou, pior, se foi saqueado em plena via por um bando (pequeno) de malfeitores.

Dario Silva

p.s.: qual será a próxima vila do concelho de Vila Nova de Famalicão? qual a localidade minhota, para lá de Famalicão, mais "perto" do Porto?