Num país à espera de feriados, toda a oportunidade conta para descartar responsabilidades. Assim se terão porventura portado, parte dos funcionários da IEP e AENOR, que coitados, pouco acostumados como eu a uma borrasca maior de neve, não se adiantaram às consequências (pre)visíveis da intempérie. Nem um limpa-neves nem um punhado de sal que se deitasse em 60 km, entre Braga e Cabeceiras de Basto.
Vergonhoso. Sou cliente da AENOR desde que montaram barraca(s) com portageiro. Deixo-lhes como quem não quer a coisa - e não quero - à volta de 500 euros anuais em tarifas. Não me ofereceram fatia de pão-de-ló, nem caneta, nem garrafa de Porto pelo Natal, como faz o merceeiro ou o dono do café central - com mais razões de queixa de mim. Ainda mal acabados os Reis e mandaram-me para a EN 206, entre Fafe e Arco de Baúlhe, estrada que já mal me lembrava de quantas curvas tinha e por que lugarejo passava, sob alçada de IEP e Câmaras tão pouco para ali virados. Pouco mais amanharam que carros de bombeiros. Contei meia dúzia de cantoneiros a fazer bonecos de neve e a imitar palestinos. Mesmo assim, que para trás mija a burra, adiantei-me valente, fazendo patinar o velho mazda quentinho por dentro de chauffage ao máximo, ziguezagueando como o orçamento do governo a cada pára-arranca, em guinadas, para não esfregar a pintura de alheios e os calços ao GNR de tenra idade, que quase me enviava à valeta porque insistiu em parar-me para aconselhar que conduzisse com cuidado - fosse eu lá adivinhar que com neve e gelo em vez de asfalto era preciso tal coisa.
Estava cortada, ora acima ora abaixo, sem mais nenhuma informação para lá de confusos telefonemas e da Rádio que nos ignorava. Via dezenas de pessoas presas a contar horas, em carros, autocarros e carrinhas de operários. Um casal de meia-idade agoirava no "nem amanhã por estas horas", que estavam "desde as 6 da manhã com um pinga de leite". Tomados pela ideia de não pernoitar por ali, largamo-nos, eu e quem trazia, de sacos às costas, abandonado o carro que ainda lá está por estas horas, com muitos outros, gelando a tinta que lhe resta algures no meio da voluptuosa Serra da Lameira. Não faltou ali quem o fizesse de modo a poder comer alguma coisa. Fomos recolhidos 4km - mais coisa menos coisa - numa aldeia por alguém que já nos esperava.
De que mundo é este País em que as autoestradas de gestão privada não respeitam quem lhes paga pela segurança e pelo conforto, e imitam a pior inércia do Estado? De que mundo é este País em que gente para lá dos montes não se pode dar ao luxo de um enfarte ou de um abdómen agudo em dias de neve? Provavelmente o mesmo país emaranhado que, mesmo em dias de sol, faz 60 km em 7horas.
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