Se calhar o atordoamento de Setembro (e domingo) não parece mas é boa altura para se refletir questões de sociedade. Recomeça um novo ano de trabalho e mais uma semana do mesmo, do novo ano legislativo. E então pergunto-me
porque é que não a Prostituição não é legal e regulamentada em Portugal...? Alguém acredita que se acaba com ela, com decreto-lei ou apenas melhorando as condições de vida da generalidade da população?
Eu penso que não. Porque, apesar das oportunidades e do dinheiro, dos apoios básicos do Estado Social, há-de haver sempre alguém disposto a pagar e alguém disposto a receber por por um serviço sexual. Nem que seja na carreira profissional e académica, onde é uma forma de persuasão tão natural e com a mesma legitimidade de uma garrafa de whisky ou um presunto.
Por outro lado há os méritos e as funções sociais que devem ser reconhecidas.
A prostituição é trabalho tão negligenciado como o trabalho doméstico, importantíssimo na estabilidade e na paz social uma vez que alivia a tensão sexual em muito solteiro tímido, viúvo e víuva, casado ou casada, sem cobertura. Além disso impõe uma maior exigência e respeito pelos deveres conjugais, muitas vezes limitados à mesa e roupa-lavada e a uma, de longe a longe, cerimónia em posição de missionário, com a luz apagada e sem imaginação nenhuma.
E incómodos católicos à parte, diga-se que é uma oportunidade de dinheiro e de mercado para quem a faz como quem faz uma massagem ou um ramo de flores. Não vejo porque não, eu também não faria pesca de caranguejo no Ártico, por muito bem remunerado e legal que seja. É portanto, uma questão de maioridade e vacinação... E vocação...
Se este país não fosse hipócrita, a profissionalização seria o verdadeiro caminho, com direito a formação, sindicato e ordem. O que seria também um garante de qualidade, de higiene e segurança. Além disso, uma profissão legalizada e regulamentada não fica exposta à exploração e aos chulos, máfias e a movimentos de mães de Bragança. Com factura, até facilitaria a investigação da troca de favores no futebol. Pelo serviço mal ou bem feito ficava também sujeita a avaliação da DECO por exemplo, ou qualquer outra entidade reguladora. Por outro lado facilitaria as coisas ao SEF em alguns casos, uma vez que uma prostituta ou um prostituto imigrado, com contrato de trabalho nos regulamentados quarteirões da luz vermelha ou ao domicílio, tem uma maior facilidade em se legalizar, fazer vida e pagar impostos.
E com isto, ironicamente, que até um País de cínicos costumes, na penúria como o nosso, ganharia. Com mais dinheiro a entrar nos cofres do Estado, melhor serviços, menos crime organizado e mais oportunidades de emprego honesto e de negócio para os seus cidadãos.
4 comentários:
Temos, pois então, mais um caso tabu, discutido neste "Tanque da Serra", versão Internet!
A população portuguesa nao estaria, porventura preparada para uma alteração moral de tal envergadura, embora eu partilhe da mesma opinião que tu!
Continua com esse teu lado Critico-literário.
Antes de mais devo dizer que, por um lado, a legalização da prostituição sempre foi um tema que me deixou algo reticente. Do meu ponto de vista, era como legitimar um comportamnento desviante. Contudo, não podemos ver a situação como tal, e tal como tu sou cada vez mais da opinião de que se devia proceder a uma legalização da prostituição.
Deixa-me também que te diga que achei pertinente o uso da expressão "trabalhadores do sexo". Nós sociólogos somos "adeptos" da expressão trabalhadores sexuais em deterimento de prostitutas.
A prostituição constitui ainda hoje um tabu de preconceitos e estereótipos, o que continua a interpelar a sociedade e os própros indivíduos. Tem a ver com com hábitos e estilos de vida de uma determinada franja da população e, por tal, é socialmente condicionada.
Muitas das prostitutas de rua, sabemos que são mulheres maioritariamente originárias de grupos sociais desfavorecidos, com pertenças familiares desestruturadas e problemáticas. Vivem em condições de vida promíscuas. É um grupo da população extremamente marginalizado.
A legalização deste tipo de trabalho seria importante, por um lado, para proteger estas mulheres da violência de que são vítimas, não só por parte dos que do serviço delas usufruem que muitas vezes as mal tratam, mas sobretudo por parte da sociedade. É óbvio que por parte da sociedade assistimos a dois tipos de vioência:
- a violência incoberta: virar a cara quando passamos por elas na rua; desprezo
- a violência aberta: insultos verbais; violência física
Elas trabalham muitas vezes em contextos violentos o que faz com que o estigma social seja ainda mais forte.
Por outro lado, além de combater a violência e a criminalidade seria importantíssimo promover a saúde pública. Muitas vezes esta população tem relações sexuais desprotegidas contaminando-se e contaminado os seus clientes. Não raro, alguns clientes pagarem mais exigindo relações sexuais sem preservativo. Daí assistirmos a elevadas taxas de HIV/SIDA em trabalhadoras sexuais e seus clientes.
Se todos estes problemas fossem tratados como laborais, já haviam soluções à vista. Daí que a legalização deste tipo de trabalho seria benéfica para combater a violência e para combater a contaminação da saúde pública. Pois sabemos que a prostituição continuará a ser um fenómeno social não irradicado.
Sim Helena, aí o tens. Concordo com a tua análise também mas não o considero um comportamento desviante se for feito de um modo consciente e informado. Alías, é facilmente verificado pela prostituição de luxo que há em Portugal.
Um país tem é de minimizar as más condições de trabalho das pessoas e prever o que é óbvio e visível a toda a gente: a ilegalidade torna estas pessoas muito mais susceptíveis à exploração. Outro dever do Estado é garantir educação e informação a todos os seus cidadãos. E aí qualquer um deverá optar pelo mais conveniente e satisfatório na sua vida.
Fantastico post! quase pensei adormecido este tema depois do pequeno barulho que uma amiga minha fez quando fundou a International Union of Sex Workers em Londres, acabou o doutoramento e lançou o livro "Trabalhadores do Sexo: Uni-vos" (Ana Lopes). Contudo, eu tal como ela, como queremos acabar com a liberalização do mercado sexual, temos algumas dúvidas sobre a legalização. Queremos a descriminalização. Bem como a maior parte dos trabalhadores do sexo. Quem diz trabalhadores do sexo, não diz só prostituição. São também as strippers, call-centers, etc.
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