domingo, 18 de dezembro de 2016

Pela boca morre o peixe


Santo António pregando aos peixes


Após os resultados eleitorais de 2013, quando a água da fervilhante campanha ainda não tinha esquentado, já os barões da mordaça, do Partido Socialista em Cabeceiras de Basto, atiçavam as suas hostes contra o ‘amadorismo’ do Movimento Independentes por Cabeceiras (IPC).

Toda a gente sabe (até esses barões da mordaça sabem) que não era contra o amadorismo que se atiçavam mas sim contra a própria incompreensão dos tais ‘amadores’ terem conseguido o mesmo número de vereadores eleitos (3) tendo estado muito próximos da vitória. O fenómeno político inédito em Cabeceiras de Basto quase derrubava o regime de duas décadas. Esteve perto. O Partido Socialista apanhou as parcas canas de uma vitória com sabor a derrota (lembro que apregoavam aos seus mais fiéis peixes que elegeriam cinco vereadores) e a procissão continuou. A luta na rua passou para a Assembleia Municipal. Estranho disseram alguns, dado que o ‘palco’ de discussão das estratégias políticas seria à partida as reuniões do Executivo Municipal. Mas cedo se percebeu que aquele que anteriormente habituado ao protagonismo de culto da personalidade não poderia abdicar de tal e a figura do Presidente eleito, Dr. Serafim China Pereira, foi relegada para segundo plano pelos barões do partido (do qual China Pereira parecia cada vez mais isolado). Afinal não estavam assim tão ‘unidos pela nossa Terra’.

As sessões de Assembleia Municipal atingiam recordes inéditos. Horas a fio, pela noite dentro, sessões que tiveram de ser prolongadas para outros dias, ataques pessoais teatralmente ensaiados entre a ‘bancada’ do PS e o Presidente da Assembleia Municipal, que em vez de um mero árbitro (assim como previsto nos Estatutos da sua função) transformava-se num ponta (de uma) lança atacando tudo e todos numa linguagem muitas das vezes insultuosa. Tudo isto constituiu uma táctica de guerra declarada, sob um objectivo que os bafientos barões pensaram ser de fácil resolução – esmagar os ‘amadores’ porque não estavam preparados, dividindo assim a sua (presumível) frágil base de apoio.

Assembleia após Assembleia o IPC revelou perseverança e prudência suficiente para não entrar no mesmo jogo desprezível para o qual os barões esfaimados tentavam arrastar. A táctica de guerra revelou-se desprovida de estratégia e tal como alertou o milenar Sun Tzu, “tácticas sem estratégia são o ruído antes da derrota”. O PS sofria a primeira; depois de menosprezar a autoridade legítima do seu Presidente eleito, este utilizaria a mesma ribalta da guerra que o desautorizava para trocar o punho pelo ‘murro na mesa’ e declarar que não compactuaria mais com os barões que o humilhavam publicamente. Acabaria por pedir a demissão. Os peixes graúdos de boca larga começavam a perder oxigénio.

De 2013 a 2016 a teatralidade continuou, mas perdendo força e consistência. Os barões mudavam de táctica e retraíam-se para outros palcos. As distritais do PS vieram e os resultados de Braga fizeram redobrar os peixes e as suas largas bocas. Mas o IPC já não eram esses “amadores”. Apresentavam-se cada vez mais sólidos e consistentes, capazes de articular particularmente bem as suas posições entre a Assembleia e o Executivo. Fizeram propostas, aprovaram algumas, saíram reprovadas muitas outras (apenas pelo preconceito de confundir inimigos com adversários políticos que toldava a vista até da ala mais dialogante do PS).

Tudo isto e três anos passaram, cheios da grandiosidade do mote do ‘Mosteiro a Património da Humanidade’, no fundo tão grande em conteúdo quanto os balões festivos – apenas de ar e pouco mais. O Presidente que sucedeu a China Pereira revelava que não estava preparado para a tarefa. Da sua incapacidade não é culpado. Culpe-se o partido por o deixar naquela posição de se ver empurrado para uma posição para a qual não foi eleito tendo de um lado os cacos da ala que apoiava China Pereira e do outro os barões que continuariam a desautorizá-lo.

Do seu lado, como escreveu o meu amigo Vítor Pimenta, o Presidente tinha “provavelmente o elemento mais competente política e tecnicamente dos vereadores com pelouro”. Tinha, pois já não tem mais. Isabel Coutinho renunciou aos seus pelouros por considerar que "a par da ausência de recursos, por diversas vezes foram tomadas decisões em matérias da minha responsabilidade, legal e política, ou sem o meu conhecimento ou com a mera comunicação das mesmas". Leia-se daqui o mesmo que poderá ser lido para a demissão de China Pereira: os barões do PS não têm cultura democrática, nem para com os seus próprios membros eleitos.

Agora pense caro leitor, pense e pergunte quem são realmente os “amadores”. Um movimento independente que em 3 anos se constituiu solidamente na cena política cabeceirense ou os barões de um partido que no mesmo período derrubaram dois dos seus membros eleitos?

No sermão de Padre António Vieira, este refere-se a Sto. António como tendo mudado o púlpito e o auditório, começando a pregar aos peixes. É bom que o PS saiba mudar antes de mais os peixes de onde recebem o pregão, porque esses vão morrendo pela boca que pregam, levando o Partido para esse mesmo caminho.

A democracia é tão mais forte quanto mais coesas sãos as forças políticas que representam as pessoas. Não é de um partido despedaçado que Cabeceiras precisa. Espero que 2017 traga algo necessariamente novo para além do próprio ano. 2017 tem de ser mudança!...

Um bom natal e um novo 2017.

sábado, 19 de setembro de 2015

É PàF espatifar?

Coligação PàF - Distrito de Braga 

Leitor, queira fazer o exercício de dizer: PàF!
O som resultante quase que poderia ser uma onomatopeia da acção de espatifar ou ser-se espatifado por algo ou alguém.

Segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa espatifar tem os seguintes significados:

1. [Informal] Espedaçar.

2. Rasgar, fazer em retalhos.

3. [Figurado] Estragar;

Comecemos pelo primeiro e atentemos para tal em alguns indicadores:

De Espedaçar:

As Terras de Basto perderam 3445 habitantes em dez anos, sendo que todos os concelhos de Basto perderam população desde 2001. Dos quatro, Cabeceiras de Basto foi o mais prejudicado com o movimento migratório, perdeu em dez anos 6,5% da sua população, ou seja, 1137 habitantes.

Mas estarão as Terras de Basto em inconformidade com o resultados dos responsáveis políticos desta PàF (e já agora igualmente da outra força política do 'arco da governação', aka, amigalhaços da alternância) no resto do país?

Não. Pois claro que não. As Terras de Basto estão na linha da frente desta dinâmica migratória que o 'académico' Poiares Maduro referiu, e passo a citar, "uma tendência desde a Segunda Guerra Mundial". Na verdade, serão mesmo necessárias situações catastróficas para que a malta dê à sola. Ora veja-se: nos últimos 5 anos (4 com Passos Coelho no leme) Portugal perdeu 200 mil habitantes (110 mil só em 2013), tornando-se a maior sangria populacional nos últimos 100 anos.   Devem ser estas tendências de que nos falava Poiares Maduro para amenizar a questão. Talvez para o mesmo, os movimentos massivos de 'emigração' que vêm da Síria, do Paquistão, do Iraque, e do Norte de África também serão uma 'tendência' desde a Guerra do Iraque.

Portugal tem ficado, assim sendo, espedaçado de gente. Elas saem deste pedaço, entre a Europa e o Atlântico, para um outro qualquer. Serve aqui como uma luva  a onomatopeia PàF.


De Rasgar, fazer em retalhos:

Parece que a taxa de desemprego desceu 1,8 pontos percentuais em relação ao anterior trimestre deste ano.
Eu percebo. Há muito mais emprego em Portugal: há os estágios profissionais a mascarar emprego a sério; há o subemprego a mascarar o emprego a sério; há o actual Governo que aposta na precariedade (ou flexibilização para gerar competitividade) e claro... o meu preferido: há menos gente para empregar, dada a sangria populacional da emigração nos últimos anos (aqui o 'rasgar' vai de encontro por acção-reacção ao 'espedaçar').
Recentemente um amigo escreveu,e passo a citar: "sabem qual foi o período histórico com menor taxa de desemprego em Portugal? Foi imediatamente após a Peste Negra. 'Eliminar' pessoas, por morte ou emigração, ajuda sempre a melhorar algumas estatísticas económicas, sobretudo as que usam percentagens."

Portugal passou assim a ser um país retalhado. Entre o retalho dos que ficam e o retalho do que tiveram (e têm) de partir.

De estragar:

Quando olho para a foto acima, não fugindo à regra de todas as outras que compõem a onda azul e laranja, penso logo numa campanha Primavera-Verão da Benetton e confesso que é mesmo difícil perante tal imagem enternecedora e de confiança, acreditar que esta gente será mesmo capaz de privatizar (a preço da China que a Three Gorges e a Fosun agradecem) Portugal inteiro.
Depois lembro-me de Saramago que Sousa Lara (PSD) 'empurrou' para Lanzarote e, PàF!, acordo perante as suas palavras:

"Privatize-se tudo, privatize-se o mar e o céu, privatize-se a água e
o ar, privatize-se a justiça e a lei, privatize-se a nuvem que passa,
privatize-se o sonho, sobretudo se for diurno e de olhos abertos. E
finalmente, para florão e remate de tanto privatizar, privatizem-se os
Estados, entregue-se por uma vez a exploração deles a empresas
privadas, mediante concurso internacional.
Aí se encontra a salvação do mundo... e, já agora, privatize-se também a puta que os pariu a
todos."


A palavra Espatifar significa ainda, em sentido figurado, "Dissipar".
Dia 4 de Outubro cabe ao leitor decidir se PàF será apenas uma incómoda onomatopeia ou uma realidade que lhe dissipará o futuro.

terça-feira, 14 de julho de 2015

longe mas ainda parte

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

boca de urna*

A história do "primeiro turno" nas eleições brasileiras de 2014, resume-se à esquerda na vitória do Partido Comunista do Brasil que elegeu pela primeira vez um governador, neste caso, no Maranhão. De resto, do que se sentiu dos resultados e no que se vai sentindo nas ruas, sobretudo em São Paulo, é uma grande rejeição ao PT. Podia ser pelas características mais conservadoras da capital paulista, esta cidade vota mais tradicionalmente à direita, mas a verdade é que os trabalhistas nunca previram que pudesse Dilma ser rematada para terceiro lugar, com Aécio a angariar quase 75% dos votos nos bairros mais ricos.

No total do país, é certo e sabido que Dilma ganhou a primeira volta (44%), mas Aécio Neves com 35% conquistou o Sul e Sudeste (onde ficam os grandes círculos eleitorais). Os 20% dos votos da Marina Silva, que já declarou apoio ao candidato "tucano" (alcunha atribuída aos membros do Partido Social Democrata do Brasil - PSDB) podem ser mesmo assim distribuídos pelos dois candidatos. A actual "presidenta" parte da pole position, e a previsão é vá buscar grande parte do restante eleitorado no Nordeste e estados do interior brasileiro, onde a pobreza é grande e as políticas sociais dos governos de Lula fizeram grande diferença.

Já Aécio, deve tomar maior parte da fatia em São Paulo e outros estados do Sudeste, com excepção do Rio de Janeiro, tradicionalmente mais "petista". Tudo dependerá onda de vitória, do funcionamento do aparelho e da performance nos debates, onde a Dilma é claramente menos preparada. Na última semana foi-se acentuando o discurso do medo no interior dos trabalhistas junto da classe média e baixa, pelo risco de "retrocesso" social que pode representar a vitória de Aécio Neves. Algo que, para quem vê de fora, parece uma jogada desesperada para os apoiantes dos governos de Lula e Dilma. É por demais evidente que, não sendo um governo suficientemente de esquerda para alguns brasileiros nem radical como o parece para outros tantos, o melhor governo da democracia no país irmão deixou uma imagem positiva do Brasil no mundo.Mas para muitos, doze anos é tempo suficiente.

Prognósticos? O Lula vai teria de suar mais para manter a sua "mulher" no poder, mas o ex-presidente está menos activo na campanha do segundo "turno". Dilma parece sozinha e aos papéis, dependendo a sua vitória do seu fiel aparelho e eleitorado. Já o neto do Tancredo Neves, Aécio, é bem capaz de ganhar da eleições, levado pela necessidade de uma lufada de ar fresco. A economia, está a crescer menos, arrisca a estagnação, os juros estão altíssimos e não há muito investimento privado. Ironicamente, no Brasil como Portugal, o povo saiu às ruas para pedir mudança, mais investimento do Estado na Educação, Saúde e direitos sociais, mas arrisca-se a eleger um governo de direita. Uma das grandes tragédias da esquerda é que muito do seu povo, do seu eleitorado, quando deixa de ser pobre, esquece que um dia já foi pobre, até que empobreça de novo. Uma coisa parece certa, ganhe quem ganhar, no dia 26 de Outubro sairá das urnas um Brasil dividido em dois.

*Boca de urna é um conceito relativo a distribuição e/ou veiculação de propaganda política no dia da eleição, sendo considerada um delito eleitoral no Brasil.

domingo, 27 de julho de 2014

em exibição

domingo, 22 de junho de 2014

a autofagia

As recentes histórias vindas do interior do Partido Socialista não auguram nada de bom para qualquer um dos candidatos a uma disputa que ainda está por confirmar-se. O episódio em Braga é a demonstração do tipo de gente e espírito que se "afeudou" dentro do partido, um punhado de caciques, apparatchicks e fieis escudeiros,  vazios de ideias e de ideologia, que já nem disfarçam o quanto espernejam por um lugar no poder. Exemplo maior, o enérgico esforço do antigo presidente de câmara de Cabeceiras, antes tão amigo de Seguro, agora arredado no seu sectarismo para um plano a que não estava habituado, que depois de dividir a secção local com as mesmas "manobras", trata de escachar em duas a federação de Braga. Entre a blindagem estatutária e o golpe de estado, está desde já minado o candidato a primeiro-ministro do PS que sair deste exercício de autofagia. Até porque não estou a ver, num calendário tão apertado, o entusiasmo dos apoiantes de um qualquer derrotado a erguer as bandeiras de um qualquer vencedor. Muito menos depois da tarde de hoje ali para os lados do Porto, onde Costa provou da atiçada populaça socialista, mesmo sob proteção dos guarda-costas  Pizarro, o cesariano dos Açores e, claro está, o sempre-em-bicos-de-pé de Cabeceiras. Quem se ri desta autólise socialista, são os do Governo cuja novela do "irrevogável", em comparação, foi uma daquelas zanguinhas de casal que acabam melhor na cama. Agora, a  única emenda possível para este PS é uma terceira via, um terceiro candidato. O pior é que as únicas hipóteses ou estão podres ou demasiado verdes.

terça-feira, 3 de junho de 2014

Silêncio!


O silêncio situa-se em dois pólos opostos. Serve para que possamos falar ou para que se impeça que se fale, serve para libertar ou para oprimir, serve para que outros sons se oiçam ou para que só um impere, o do próprio silêncio. O escritor moçambicano Mia Couto escreveu em tempos um livro com o título “Venenos de Deus, remédios do Diabo.” Nos dias de hoje, o silêncio parece-me que é usado precisamente nesse sentido, como um veneno divino, porque aceite sem questionar, e um remédio do Diabo, acreditando que nos cura quando alastra a doença.

É da crise da democracia de que falo. Ou melhor dizendo, das democracias, um pouco por toda a Europa, para restringir territorialmente a esse continente a análise. Das últimas eleições europeias nada de novo, isto é, nada que já não fosse expectável. No entanto, a subida das forças politicas assentes ideologicamente na extrema-direita é algo que a todos nos deverá preocupar e que perante essa preocupação, o silêncio nunca poderá ser a melhor resposta. Este não é tempo de reflexões profundas mas de ações concretas. O silêncio demonstrará tão só que desacreditando totalmente na Europa deixaremos que os partidos do poder se reúnam cada vez mais ao centro enquanto a Europa se desmantela ao som do populismo fácil da extrema-direita que mobiliza o descontentamento de quem deixou de acreditar na social-democracia porque esta casou com o neoliberalismo.
Concretamente, temos um claro relato de Lúcio Machado, empresário mondinense que o New York Times foi descobrir. Este homem é um entre milhões que sofre as consequências do jogo de casino em que a banca se tornou, onde a desregulação financeira asfixia a economia real, aquela que produz realmente mas que a finança especulativa insiste em destruir. Um destruição levada a cabo pelas suas taxas de juro calculadas com base no mesmo universo do desconhecido com que as agências de rating emitem os seus resultados que influenciam estrondosamente e absurdamente o financiamento dos países só porque os mercados “acordaram de mau humor”.

Aproximando a lupa a uma escala mais reduzida, os episódios circenses com que as reuniões de Assembleia em Cabeceiras tem sido levadas pelo seu presidente e pela bancada socialista deveriam envergonhar qualquer pessoa que se diga democrata. A negação repetida do uso da palavra, princípio básico da democracia, escudando-se em leituras obscuras do regimento é prova de que quem impõe o silêncio teme ouvir a palavra, sabendo que o que ouvirá é a verdade. Perante tudo isto, a paródia aumenta de tom quando o desrespeito pelo órgão democrático que é a Assembleia Municipal é protagonizado por aqueles que de forma lírica com voz pouco musical insistem em proclamar os valores de Abril enquanto se usassem o silêncio era bem mais sensatos.


Por último, foi com enorme prazer que estive à conversa com José Pereira que completou recentemente 101 anos. Mesmo o seu século de existência não lhe faz tremer a voz. O silêncio que insiste em fazer quebrar deveria ser inspiração para muitos jovens que lentamente deixam que o silêncio os adormeça e acabam por se abster da vida quando o presente precisa tanto que a força da palavra lhes comande o corpo e a mente.

in Editorial Jornal O Basto, Maio 2014

terça-feira, 27 de maio de 2014

Noite das facas longas, porque ganhar é relativo


O semi-eterno candidato à liderança do Partido Socialista, António Costa, pulveriza as tréguas assinadas com Seguro, e avança com uma candidatura à liderança do PS. Esperemos, então, pelo congresso extraordinário - que depende da marcação por parte da atual direção ou de um pedido rubricado por metade das federações (e demais agremiações locais) do PS. Note-se que a vitória de Pirro alcançada por PS de Seguro nas eleições para o parlamento europeu foi o limite traçado por Costa, aquando o acordo com Seguro, no qual se instituiu o clima de "paz pobre" no PS. No entanto, o PS alcançou uma vitória eleitoral e as elites internas entram em ebulição. Porém, e atendendo às circunstâncias que envolvem estes partidos, as hostes do PSD e CDS, após uma derrota história, estão num silêncio tumular. Por vezes o silêncio é a melhor defesa. A única, diga-se. Veremos. Não poderia deixar de destacar a acalmia perturbadora de um outro aglomerado político que sofreu uma derrota esclarecedora nas eleições para o parlamento europeu. Obviamente, falo do Bloco de Esquerda. Algo vai mal naquele reino e ninguém se mexe e muito menos admite/aceita a derrota. Temo pelo pior. Em conclusão, em Portugal, a nação das expectativas, as vitórias e derrotas eleitorais são sempre relativas. Há quem ganhe sempre. Há quem nunca perca. Há quem ganhe e inicie uma guerra civil. Há quem perca e não se passe nada.

segunda-feira, 26 de maio de 2014

brumas no futuro

PS: ganhou por uma migalha, mas Tozé Seguro e as gastas elites dirigentes do PS insistiram toda a noite eleitoral numa "vitória esmagadora". Em negação. Se estes 33% fossem numas legislativas seria uma maioria relativa, uma vitória curta que atestava a incapacidade da liderança de António José Seguro em capitalizar o descontentamento. O PS tem de olhar para si e tirar as conclusões do que o "aparelhismo", o nepotismo e o vazio ideológico tem feito ao partido. Não admira que hoje não se vejam bandeiras à entrada do Altis

PSD-CDS: uma derrota doce. Esta derrota por pequena margem face a "socialistas" sem capacidade de aglomerar o protesto, nem apresentar uma verdadeira alternativa, prende Seguro ao PS para as próximas legislativas. Basta usar os dividendos da saída da troika e a "almofada financeira" para meia dúzia de medidas eleitoralistas e a dulpa Passos-Portas arrisca-se a ganhar as próximas eleições, e forçar os socialistas a vergarem-se numa grande coligação.

CDU: Ganha mais um eurodeputado. Teve uma campanha limpa e centrada nas suas propostas. Consegue algum do eleitorado socialista mais à esquerda, mas acaba por empatar. Não consegue sair daquela fatia de eleitorado fiel, com mais ou menos mozarela.

MPT: Vitória da noite para o populista, justiceiro e ultramontano Marinho e Pinto, que beneficiou da sua projecção mediática e do descontentamento do eleitorado do "Você na TV". O MPT, na verdade, é uma espécie de PNR com pele de cordeiro e alarga a direita em mais 7%. Ah, e que agradeça ao Goucha, o seu oficioso director de campanha, ainda que a Marinho lhê dê comichão os "maricas".

BE: Ficar atrás do MPT, esta noite foi "pior do que falecer".

Livre: conseguiu capitalizar os votos e os apoiantes do canal Q que dantes votavam Bloco de Esquerda, sobretudo em Lisboa. Pode ser que Rui Tavares vire deputado em São Bento. É uma agradável despromoção. Só tem de sobreviver um ano a "pão e água".

Abstenção, brancos e nulos: que agradeçam à campanha em que não se discutiu a Europa, a uma guerra de tomates podres entre os partidos do Arco da Governação e a uma comunicação social que não fez o trabalho que devia. Se pelo menos os brancos e nulos valessem lugares vazios...

EUROPA: A ascensão da extrema-direita devia fazer os partidos sociais-democratas e europeus repensar a sua ligação com as elites financeiras e a deriva neoliberal.

sexta-feira, 23 de maio de 2014

Há uma linha que separa


E às páginas tantas na sua "lição de democracia", na aula magna do passado dia 16 de maio de 2014 (2:53:19), diz Abílio Alves: "Eu pergunto às pessoas de Cabeceiras de Basto que votaram IPC, se efectivamente ainda se sentem representadas por estes elementos que elegeram?". Eu pergunto, o que pensarão os eleitores que votaram nele?

quarta-feira, 21 de maio de 2014

No meu relógio são horas de votar


Infectados pelo vírus da apatia geral, é fácil ignorar as europeias, como voto que nos parece entregue a decisões distantes em que pesamos pouco. A verdade é exactamente oposta. Estas são as mais importantes eleições de sempre porque os portugueses tem o direito e o dever de mostrar à Europa o seu desatino com o que esta se tornou: um espaço de influência do eixo franco-alemão, de humilhação dos povos do Sul, de chacota da identidade e da soberania nacional, de guerras de carácter entre povos que antes se uniram num esforço solidário comum. Sou europeísta convicto, mas esta não é a minha Europa e longe estou eu de me ver representado, nestes tempos, por deputados embarcados em partidos que viraram agremiações de "conde andeiros e miguéis de vasconcelos", partidos que tem abominado a opinião dos eleitores, que fazem ouvidos moucos às suas inquietações. É impossível ver este videoclip dos Mão Morta, sem se ferverem as entranhas de tanta falta de consideração da elite política e económica, que assobiam para o lado perante a manifestações pacíficas. Se não tremem perante tamanho descontentamento, que sirvam os votos como balas para penalizar esta ridícula parada de bobos, bem interpretados nas figuras do duo Rangel-Melo e do aparelhismo de couraça do partido socialista. Três mandatários da política da evasão, com os seus dedos em riste, os actos de virgens ofendidas, do boomerang da culpabilidade. Um PSD-CDS que tenta ganhar votos com dois papões, "que podem voltar se os portugueses se portarem mal": Sócrates e a Troika. E um PS, sem projecto político nem verdadeira alternativa, que tenta ganhar dividendos do descontentamento com o Governo. É esta a apresentação geral de uma tríade que nunca discutiu a Europa com os portugueses, não quer discutir a Europa e que prefere que a "europa" decida tudo e que decida por eles e por nós. As europeias podem parecer tão longínquas da nossa vida como Bruxelas, mas são a oportunidade de por no trilho uma União Europeia há muito comboio desgovernado que está prestes a descarrilar, são a oportunidade de chamar à razão um projecto que nos tem defraudado. São a oportunidade de impedir a ascensão do néscio fascismo sobre o húmus da social-democracia degenerada. Pelo meu relógio, são horas de votar!

sexta-feira, 16 de maio de 2014

A ilusão da mudança

Nas próximas europeias, votar PS, PSD e CDS é votar essencialmente na mesma coisa, no mesmo projecto disforme de Europa, muito afastado dos princípios que fundaram a União. É votar no caminho de um federalismo forçado, que só não tem tentado desfazer as identidades nacionais, a soberania dos povos, como tem acicatado o mais ignóbil e assustador do nacionalismo. Como diz Pacheco Pereira, esta é "uma Europa que se deixou esvaziar do seu melhor". Pior, sob o uso de uma política externa desastrosa e das orientações económicas da Alemanha, tem alimentado a maior vaga de eurocepticismo que me lembro de assistir, dentro e fora do espaço europeu. Eu próprio vejo-me mais um eurocéptico desta Europa decidida nas cúpulas, que humilha os parlamentos e governos nacionais e despreza a opinião dos seus cidadãos na construção da União (lembrai a aversão da Comissão Europeia aos diversos referendos ao Tratado de Lisboa). Os próprios partidos políticos do arco do poder, retiram os olhos do cidadão das decisões que tomam à sua revelia. Estão-se a marimbar para o que os portugueses possam pensar da Europa. Nem querem que se discuta. Fazem antes das "europeias", mais uma ronda na dança das cadeiras, na pole-position nos lugares que já ocupam e só se revezam aqui e ali. Os partidos do governo a ensaiar o melhor resultado possível, sabendo que as perde. E os "socialistas" a tentar segurar a figura insossa do seu secretário-geral. Está o país, como diz Clara Ferreira Alves, entregue a "apparatchiks encarregues de ganhar eleições". Vide só a matilha do reumático que o PS põe na lista. Senadores, que de outro modo já fartaram o calo das nádegas em São Bento e vão reclamar o prémio de lealdade e "sova no lombo" assentando arraiais em Bruxelas. Vide a lista desta nova AD, que não se coibiu de afastar um dos eurodeputados mais trabalhadores, como Diogo Feio, certamente não tão bonito como aquele par de jarros na fronte: o nasal Rangel dos 101 Dálmatas e o carinha de don juan do Nuno Melo e o seu discurso Moët & Chandon com que brindou ao "fim do programa do ajustamento". Os portugueses que bebam champomix.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

o regresso da canção política


O Festival da Eurovisão, ao contrário das últimas edições, teve este ano o significado político de outrora. Voltou, em 2014, a ser palco maior do velho continente no uso da cantiga como arma. A vitória de Conchita Wurst, a drag queen em que se transforma Thomas Neuwirth, vai além da extraordinária performance e da qualidade da canção em si, independentemente das outras boas canções que poderiam ter ganho. É a afirmação do sentimento europeu de paz e de liberdade, espaço onde a verdadeira democracia só o é se abarcar toda a diversidade humana. É sobretudo a vitória de uma Europa, renascida das cinzas da Segunda Guerra Mundial, moderna, tolerante e democrática, contra a hipocrisia do preto e branco, a ditadura da normalização. É a tomada de posição contra a visão da Rússia de Putin sobre o mundo, cabeça de um regime musculado que tem incentivado a perseguição violenta de lésbicas, gays, bissexuais e trangenders (LGBT) naquele país. We're here, we're queer, get used to that.

A saúde e o circo

Não quero minorar a romântica candidatura do Mosteiro de Refojos a património da Humanidade, que mereceu toda a pompa da circunstância na reunião de há dias na Casa do Povo de Arco de Baúlhe, com sala cheia, incentivada pelo fervor do pároco na "defesa do que é nosso", ou coisa parecida. Mais uma "estação na via sacra" que a comitiva municipal tem feito pelas "capelinhas" do concelho. No entanto, era de melhor tom que as entidades da freguesia, ou paróquia, e demais responsáveis concelhios, focassem as suas atenções nos reais problemas da população que se dizem representar. Moribunda que está a extensão de Saúde em Cavez, a verdade é que a Extensão de Saúde de Arco de Baúlhe arrisca-se a encerrar portas. Há já centenas de utentes sem médico de família desde Janeiro e entregues os serviços mínimos a tarefeiros.

Isto é só o primeiro passo para que muitos, senão todos, sejam empurrados para a sede de concelho, já inchada da centralização de serviços. De entre os utentes, não esquecer os quantos que vinham de concelhos vizinhos até ao Arco e faziam girar o comércio desta vila. Isto sim, diz respeito aos arcoenses, à sua economia e à sua identidade. Isto sim, devia levá-los à Casa do Povo. Isto sim, devia levá-los para a Rua como faziam dantes.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

O capitalismo simplesmente não funciona: a desigualdade provocada pela concentração da riqueza ameaça destruir-nos

O trabalho de Thomas Piketty confirma certos pré-conceitos que tinha em relação ao capitalismo, a saber: trabalhando não se enriquece; o berço (o que herdamos) é o elemento determinante da nossa vida económica e social; a desigualdade na concentração de riqueza não é imutável nem um designo divino; promove o individualismo, em toda a sua dimensão diabólica. Permitida pela ideologia do "extremismo meritocrático", de natureza próxima de um darwinismo social, é esta a norma social actual.

Tudo isto pode ser explicado através de um episódio alegórico que não me canso de contar a quem me dê um par de ouvidos:
Era uma vez um João e um Mário. Ambos possuem idênticas condições físicas e mentais, partilhando o mesmo espaço físico. O João, é filho de um operário que tudo fez para lhe dar uma boa educação e o mínimo de condições de subsistência. Herdou do pai, apenas o que o pai lhe deu durante a vida: a educação e a força de viver. O Mário é filho de um latifundiário, que lhe deixou propriedades e um milhão de euros em títulos financeiros e em depósitos a prazo. O João farta-se de trabalhar, suando oito horas por dia, seis dias por semana, num sector que produz bens essenciais. O Mário vive dos rendimentos. Nunca trabalhou nem tem "pretensão" para tal, apenas investe e reinveste o que arrecada com o que herdou em títulos financeiros, sendo um reconhecido "jogador" da roleta da economia financeira. O João vive na base da pirâmide social e de lá não sai, mesmo na eventualidade de trabalhar mais um par de horas por dia. O Mário é por "mérito próprio" um ser socialmente apto que vive uns degraus acima do João na pirâmide social. O João chora todos dias. O Mário vive majestaticamente. Moral: o sistema protege e recompensa os "sortudos", condenando os "azarados". Conclui-se, assim, que tudo se decide no berço, uma consequência por estarmos socialmente estacionados na idade das trevas. Não evoluímos muito, pois não?

Mágico


 Light in Babylon, Hinech Yafa